Thursday, October 25, 2012

“Evocação do Recife”


“Recife . . .
                        Rua da União . . .
                                                            A casa de meu avô . . .
Nunca pensei que ela acabasse!
Tudo lá parecia impregnado de eternidade

Recife . . .
                        Meu avô morto.”

(Manuel Bandeira, de “Evocação do Recife”, 228)

Manuel Bandeira usa muita reticência (aqui indicada pelo uso da elipse) no seu poema “Evocação do Recife”. Este trecho do fim do poema é um de meus prediletos. O poema inteiro é saturado pela nostagia, e esta parte mais do que qualquer outra. Sugerindo com as elipses que existem coisas que nem dá para explicar, o poeta liga Recife com a casa de seu avô, a quem ele aparentemente amava, e explica como parecia que tudo nunca ia acabar. E em vez de dizer, “Porém, acabou”, ele nos transmite esta mensagem com a frase final: “Meu avô morto”. Sentimos a tristeza do poeta, e entendemos que ele também está falando da morte de algo além do avô: a morte de seu amado Recife como ele conhecia.

Eu gostei da evocação de som no poema. Ele cria espaço branco dentro da frase, “De repente      nos longes noites um sino”, como se fosse realmente um sino repicando. Cria as vozes do passado nas brincadeiras e canções das crianças. Até a palavra “Capibaribe” repetida várias vezes no poema cria uma atmosfera de música feliz, quase como uma frase mágica que vai trazer de volta tudo que foi perdido e aliviar aquela nostalgia profunda.




Friday, October 19, 2012

African Worlds: Lectures on Africa and the Humanities at BYU


Ontem, 18 de outubro, aos 11 horas na sala 238 do HRCB, Ana Caterina Teixera veio para fazer um discurso intitulado “The Missing Protagonists: Revisiting the Role of Cubans in Angola’s Post-Independence Literature”. Ana Caterina é professora de português no MIT e fez seus estudos pós-graduados na Universidade de Brown. Ela tem pesquisado a história lusófona da África, especialmente Angola, e nos explicou quanto a literatura tem a ver com a história, ou a política, de um país. De acordo com as pesquisas dela, Angola atingiu uma identidade distinta de Portugal primeiro na literatura, e depois na realidade political. Angola, a maior de todas as ex-colônias de Portugal, recebeu ajuda de Cuba para conseguir a sua independência. Apesar disso, em algumas obras literárias chaves desta época, nenhuma personagem cubana aparece. Este discurso me deixou com uma ideia de quanto que ainda não conheço no mundo. Abriu a minha visão e me fez compreender o poder que reside na pena. “A pena é mais poderosa do que a espada”. Tem o poder de unir o povo debaixo de uma ideologia. “O que é determinante para a unidade é a ideologia e não a geografia”.

Thursday, October 18, 2012

“Ó poesia sonhei que fosses tudo"


“Ó poesia sonhei que fosses tudo
E eis-me na orla vão abandonada
Uma por uma as ondas sem defeito
Quebram o seu colo azul de espuma
E é como se um poema fosse nada”
(Sophia de Mello Breyner Andresen, [sem título], 218).

Eu adoro este poema. O mar é tudo para Sophia de Mello Breyner Andresen. Simboliza tantas coisas—a criação entre elas. Neste poema o mar também simboliza um tipo de abandono. Na orla, a mulher (imagino que é mulher) é deixada entre a beira da terra e da água. “Terra de ninguém é onde eu vivo”, Sophia escreveu em um outro poema. Aqui as circunstâncias têm deixado o narrador em terra de ninguém. As ondas que ela fita vão rolando ‘sem defeito’, perfeitas no seu movimento. E ela, deixada sem rumo, até perde o consolo que a poesia lhe trazia. Para ela, imagino que a poesia dever significar a expressão de emoção forte e a renovação ao expressá-la. Mas, solitária na orla, ‘é como se um poema fosse nada” em comparação com os sentimentos com as quais ela está lutando. Ela também poderia estar dizendo que a poesia é nada em comparação com o mar, eterno e belo.

A poesia de Sophia de Mello Breyner Andresen tem um tipo de nostalgia. Ao ler, quase me parece que eu já li em algum lugar, talvez quando era criança. Eu acho que tenho este sentimento porque ela consegue transmitir tão perfeitamente emoções profundas que são universais na geografia e no tempo. É como se fosse redescobrindo a sua própria natureza nas páginas.

Thursday, October 11, 2012

"A valsa"


"Na valsa
Tão falsa,
Corrias,
Fugias,
Ardente,
Contente,
Tranqüila,
Serena,
Sem pena de mim!"

(Casimiro de Abreu, “A valsa”, 128-129)

Adorei a música que se encontra neste poema. A rima constante e versos de três sílabas dá a impressão de realmente estar em uma valsa. Se captura o movimento no poema nos verbos: corrias, fugias, saltavam, voavam, brincavam, tremias, sorrias. Se empregam muitas rimas pobres (palavras da mesma classe gramatical) por causa da quantidade das rimas. É um ritmo feliz e despreocupado, colocado em justaposição com a dor e sofrimento do narrador.

O amante é aparentemente jovem e muito vulnerável à dor da amada mulher inconstante. Ele examina o rosto dela—os olhos, o cabelo, a sorrisa. Em um só instante, Casimiro de Abreu nos conta uma história que todo o mundo reconhece. Falecido aos 21 anos, Casimiro de Abreu tinha “uma perspectiva adolescente [do amor romântico] . . . exprimindo tanto o medo, quanto as fortes paixões” (Frederick G. Williams, Poetas do Brasil, 126). Neste poem, ele captura perfeitamente nos versos a vulnerabilidade que o amor traz, e o medo do amor que não é correspondido.

Thursday, October 4, 2012

"O morcego"


“A Consciência Humana é este morcego!
Por mais que a gente faça, à noite, ele entra
Imperceptívelmente em nosso quarto!”
(Augusto dos Anjos, “O morcego”, 214).

A poesia de Augusto dos Anjos pertence à época de Realismo e Naturalismo, que começou em 1881 no Brasil. Ele, conforme as características deste movimento, queria explicar os por quês da vida por meio da ciência. Segundo ele, o comportamento do humano podia ser compreendido só no contexto do ambiente na qual se encontrava e as regras científicas que governavam a mente e os hábitos. Sabendo disso, ficamos mais prontos para entender o soneto “O morcego” por Augusto dos Anjos.

Usando como metáfora um animal (ao qual nós normalmente atribuímos uma natureza fixa), Augusto dos Anjos explica o que é a consciência humana. Como todos os sonetos, tem catorze linhas. É um soneto italiano, pois é composto de 8 linhas, que têm um esquema de rima (neste caso, ABBA BAAB) e 6 mais linhas com outro esquema de rima (CDE CDE). A interpretação e o ponto crucial do poema se econtram nas últimas linhas aqui citadas. À noite, a consciência muitas vezes vem para nos perturbar. Nossos pensamentos mais escuros e desaminadores vêm nos mordendo como este morcego. Ficamos apavorados apenas pelo toque do ‘animal’. E por mais que nós façamos, Augusto de Anjos fala, este animal faz entrada na nossa cabeça. É um comentário da psicologia do homem e como há coisas que ficam além do poder dele para mudar, coisas imutáveis da natureza—assim como o morcego não tem poder para mudar a sua natureza.